Suicídio é a 4ª maior causa de morte entre jovens no mundo, alerta OMS
Campanha Setembro Amarelo chama a atenção de pais e
educadores sobre automutilação infantojuvenil como fator de risco para o
suicídio; municípios da região oferecem serviços gratuitos de cuidado à saúde
mental
Beth Soares | Tribuna Liberal
O suicídio é quarta causa mundial de morte entre jovens de 15 a 29 anos de idade, depois de acidentes no trânsito, tuberculose e violência interpessoal. O alerta é da OMS (Organização Mundial da Saúde) e embasa a Campanha Setembro Amarelo que, neste ano, chama a atenção para a automutilação infantojuvenil como fator de risco para o suicídio.
Especialistas afirmam que,
em 90% dos casos, o suicídio pode ser evitado e reforçam a necessidade de
fortalecimento das políticas públicas para a saúde mental. Na região, Sumaré,
Nova Odessa, Hortolândia, Monte Mor e Paulínia oferecem atendimento gratuito
para pessoas em sofrimento emocional. Hortolândia tem programa educacional para
combater o bullying nas escolas (veja reportagem abaixo).
Uma carta endereçada aos pais, responsáveis e educadores com alertas sobre a automutilação como indicador de risco para o suicídio de adolescentes e jovens acompanha os materiais de divulgação da Campanha Setembro Amarelo, com o mote “Se Precisar, Peça Ajuda”. O livreto assinado pela ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria) e o Conselho Federal de Medicina oferece orientações de como os pais podem identificar comportamentos que sinalizem que o jovem precisa de ajuda e apoio emocional.
De acordo com a ABP, a automutilação é qualquer comportamento do jovem envolvendo agressão direta com o corpo, sem intenção consciente de suicídio, mas considerado fator de risco para se tirar a própria vida. “Ao lidar com frustrações ou quando estão vivendo situações extremas, os jovens podem recorrer a comportamentos de risco e agressivos, sejam com outras pessoas sejam consigo mesmos. Por isso, devemos ficar atentos”, afirma trecho da carta.
Entre os comportamentos que sinalizam automutilação listados pela Associação e o Conselho estão consumo de álcool e outras drogas, início precoce da vida sexual, e, principalmente, lesões que nunca cicatrizam, arranhões, falta de cabelo em locais específicos da cabeça, mordidas, manchas, queimaduras, que sempre surgem sem explicação.
“Muitas vezes, essas lesões ficam em locais escondidos, nem sempre são nos braços ou pernas. A intensidade, repetição e continuidade também são importantes para o diagnóstico”, destaca a ABP.
Isolamento, impulsividade, tristeza constante, distorção de imagem corporal, dificuldade de relacionamento com pessoas da mesma idade, insegurança, queda no rendimento escolar, crises de raiva e baixa autoestima estão entre os fatores que indicam sofrimento emocional listados na carta, cujo conteúdo completo está disponível no site www.setembroamarelo.com.
Segundo dados da Secretaria de Vigilância em Saúde, divulgado pelo Ministério da Saúde em setembro de 2022, entre 2016 e 2021 houve um aumento de 49,3% nas taxas de mortalidade de adolescentes de 15 a 19 anos por suicídio no Brasil, chegando a 6,6 por 100 mil, e de 45% entre adolescentes de 10 a 14 anos, chegando a 1,33 por 100 mil. No mundo, mais de 700 mil cometem suicídio, ao ano, segundo estudo da OMS, publicado em 2019, englobando todas as faixas de idade.
A OMS constatou, também, que em países da Europa houve um declínio nas taxas de suicídio e observou-se um aumento em nações do Leste Asiático, América Central e América do Sul. Atualmente, apenas 38 países são conhecidos por terem uma estratégia nacional de prevenção do suicídio.
É possível evitar
“Precisamos orientar para conscientizar, prevenir, e, no mês de setembro, concentramos nossos esforços e vamos para a prevenção efetiva do suicídio. A morte por suicídio é uma emergência médica e pode ser evitada através do tratamento adequado do transtorno mental de base”, assinala o presidente da ABP, Dr. Antônio Geraldo da Silva.
Desde 2014, a ABP, em parceria com o Conselho Federal de Medicina, realiza a Campanha Setembro Amarelo de Prevenção ao Suicídio no Brasil. Neste ano, estão previstos no decorrer do mês eventos on line, iluminação de espaços públicos e monumentos no tom amarelo, campanha nas redes sociais e disponibilização de cartilhas informativos no site www.setembroamarelo.com.
Hortolândia ensina bons afetos e combate o bullying nas escolas
Aulas para combater o bullying fazem parte do currículo escolar da rede municipal de ensino de Hortolândia onde os estudantes aprendem, desde cedo, a cultivar bons afetos e respeitar as diferenças. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), o bullying é considerado um dos fatores de risco para transtornos mentais, que podem levar adolescentes e jovens a tirar a própria vida pelo sentimento de isolamento e rejeição.
De acordo com a Secretaria de Educação, Ciência e Tecnologia, os professores são capacitados para o trabalho de prevenção ao bullying. As atividades incluem palestras para a equipe escolar, orientação aos pais, intervenções com crianças e estudantes e outras atividades.
“O suicídio não é fenômeno individual, ele faz parte de um contexto que pode atuar para aumentar ou diminuir a probabilidade da sua ocorrência. Nesse sentido, o Núcleo Educacional Multiprofissional atua diante das violências contra crianças e adolescentes (o que inclui o bullying, o racismo, a homofobia e a transfobia) e com dificuldades comportamentais e emocionais, oferecendo suporte técnico e psicossocial”, afirma nota da Secretaria de Educação.
Municípios disponibilizam serviços gratuitos de apoio à saúde mental
Municípios da região disponibilizam atendimento gratuito para pessoas com transtornos mentais. Em Hortolândia, a Prefeitura informou, por meio da Assessoria de Imprensa, que os serviços são oferecidos pelas unidades de saúde, os CAPS (Centros de Atenção Psicossocial) e as unidades de urgência e emergência.
Os moradores também podem ter acesso a atendimento psicológico nas Unidades Básicas de Saúde e nos CAPS, gratuitamente. É necessário encaminhamento/acolhimento para o serviço de referência, observa nota da Prefeitura.
Em Monte Mor, além do CAPS, o município oferece atendimento com psicólogo social nas duas unidades de atendimento do CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) e no CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social). Casos de tendências suicidas são encaminhados para o acompanhamento com psicólogos clínicos, que atuam na rede de saúde, segundo a Assessoria de Imprensa da Prefeitura.
Durante a campanha Setembro Amarelo, em Monte Mor, estão previstas palestras preventivas nas escolas e decoração das unidades dos CRAS no tom amarelo para destacar a importância da assistência e orientação para prevenção ao suicídio.
O acesso à Saúde Mental no município de Nova Odessa é disponibilizado pela RAPS (Rede de Atenção Psicossocial), com pontos de atendimento às pessoas com transtornos mentais e/ou com problemas de uso de crack álcool e outras drogas, ideação ou tentativas de suicídio, de todas as idades.
Segundo a coordenadora da Saúde Mental da Prefeitura de Nova Odessa, a enfermeira Maria José da Cruz, a RAPS é formada pelas UBSs, Equipe Multidisciplinar, CAPS, Central de Ambulâncias 192, Hospital e Maternidade Municipal e Ambulatório de Especialidades Médicas. No caso dos adolescentes e jovens, os atendimentos psicológicos são realizados individualmente e/ou em grupos.
Maria José informou que a programação da Campanha Setembro Amarelo prevê palestra sobre suicídio para servidores municipais, profissionais da saúde e usuários das unidades básicas de saúde, além de panfletagem em lugares públicos.
Sumaré e Paulínia não responderam à reportagem. Os dois municípios possuem unidades do CAPS, segundo informações disponibilizadas em seus sites governamentais.
Psiquiatra transforma dor em livro e ajuda a preservar vidas
Há 11 anos, a médica psiquiatra Maria Cristina de Stefano, autora do livro “Suicídio, a epidemia calada”, se dedica ao trabalho de preservar vidas e prestar auxílio aos enlutados. Ela transformou a dor da perda do seu filho, o artista plástico Felipe de Stefano Balster Martins, que tirou a própria vida aos 34 anos, em apoio a outras pessoas. Desde 2016, Maria Cristina é voluntária do CVV (Centro de Valorização da Vida) , instituição que, há mais de 50 anos, oferece acolhimento emocional por meio da escuta, no telefone 188 ou pela Internet.
“A minha missão de vida tem sido ajudar outras pessoas em seus sofrimentos.... Posso dizer que meu plano de vida, pessoal, profissional e social está lúcido, ampliou os horizontes e acrescentou vida aos meus propósitos humanos. Jamais poderia imaginar que um dos meus filhos se mataria. A vivência desta situação cruel me ressignificou...”, afirma a autora no site do projeto “Suicídio: epidemia calada”, o www.suicidioepidemiacalada.com.br.
Lançado em 2014, pela editora Ofício das Palavras, o livro foi publicado com o intuito de alertar a população sobre suicídio e os seus sinais, segundo a autora. Nas 208 páginas da publicação, Maria Cristina compartilha com o leitor os conteúdos escritos nos diários de Felipe, encontrados por ela, no apartamento do filho, após o suicídio. “Eu descobri um filho que eu não conhecia, mórbido, doente, que escondia suas dores por trás do comportamento sociável, brincalhão e humor sarcástico”, conta.
O livro também revela o sofrimento emocional de Felipe, expresso através da arte. “A principal mensagem de seus quadros sempre foi a ironia, o desprezo pelo senso comum e o sarcasmo com os aspectos triviais do existir. Alguns quadros nós conhecíamos, pois chegaram a ser mostrados por ele. Mas, a maioria deles só fomos encontrar depois de sua morte, em seu apartamento, escondidos debaixo da cama, do colchão e enrolados dentro dos armários. De forma intencional e lúcida, escondeu suas verdades existenciais expressas em suas pinturas tão reveladoras”, narra Maria Cristina.
“Que esta biografia dê conta de situar no tempo e no espaço, não só a vida artística de Felipe, mas que possamos compreender a obra inacabada pela depressão grave e suicida. Penso que muito ele ainda iria produzir se a decisão fatal não tivesse interrompido sua arte...”, afirma a autora do livro que nas suas palestras orienta pais, familiares, amigos e educadores como identificar sinais de comportamento suicida e como ajudar pessoas em sofrimento emocional.
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