Presença feminina reduz desigualdade de gênero na segurança pública
Mulheres são destaque nas guardas municipais da região, em funções antes ocupadas somente por homens, e chegam a representar até 25% dos patrulheiros das corporações nas cidades, como é o caso de Hortolândia
Beth Soares | Tribuna Liberal
Lugar de mulher é onde ela quiser, inclusive na área da segurança pública. Na região (Sumaré, Hortolândia, Monte Mor e Elias Fausto) as mulheres conquistam espaço e fazem a diferença no efetivo das GCMs (Guardas Civis Municipais). O número de patrulheiras ainda é tímido, varia de 4% a 25% do total do efetivo, nas cidades que disponibilizaram dados ao Tribuna Liberal, mas o suficiente para diminuir a desigualdade de gênero nas corporações, cujos cargos, um dia, já foram exclusividade dos homens.
Estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, realizado em 2024, aponta que, em todo o Brasil, a mulher está presente em menos de 17% do efetivo das guardas municipais (veja reportagem nesta página). Dentre as cidades entrevistadas, Hortolândia é a que tem o maior percentual de mulheres no efetivo da Guarda Municipal. O time feminino representa 25% do total de patrulheiros, segundo informações da Secretaria de Segurança, por meio da Assessoria de Imprensa.
“Este percentual tem se mantido, pois à medida que as GMFs
(Guardas Municipais Femininas) têm se aposentado, outras estão ingressando na
força de segurança”, destaca a Secretaria, que não forneceu dados sobre o
número de patrulheiros da corporação, alegando motivos de segurança.
De acordo com a Secretaria, as guardas municipais femininas
de Hortolândia atuam no patrulhamento das ruas, nos grupamentos especiais como
Canil e ROMU (Rondas Ostensivas), no Controle Operacional. Também estão
presentes na Central Integrada de Monitoramento, nos setores administrativo, de
desenvolvimento e ensino, além do estratégico e de inteligência.
Atualmente, o posto de subcomandante da Guarda Municipal de
Hortolândia é ocupado por Regina Célia Moreno Belufe, guarda municipal há 14
anos. Adriana Carvalho exerce a função de secretária adjunta de Segurança. “A
mulher em uma equipe traz equilíbrio entre razão e emoção para as decisões do
dia a dia”, comenta Regina Belufe.
Em sua trajetória como Guarda Municipal, Regina diz que o maior desafio é lidar com o preconceito. “Quando fui para especialidades como a ROMU e o Canil, por exemplo, alguns colegas não entenderam que sou guarda como qualquer outro e estou sempre empenhada em aprender cada vez mais”.
Regina Belufe: subcomandante da Guarda Municipal de Hortolândia diz que a mulher em uma equipe traz equilíbrio
Sumaré conta com nove mulheres no quadro de funcionários da
Guarda Municipal, formado por 134 patrulheiros. O número representa uma
participação feminina de 6,71%. Elas realizam operações ostensivas e
preventivas, além de serviços administrativos.
Rosely da Silva Pereira é uma dessas nove patrulheiras. Na corporação há 16 anos, ela conta que sempre teve vocação para a área de segurança. “Achava lindo mulheres fardadas, ficavam mais empoderadas e isso me atraiu”, recorda Rosely que, antes de ser GM, exerceu a função de vigilante patrimonial.
Para ela, a rotina “exaustiva” de trabalho por causa dos plantões, além dos riscos constantes, inerentes da profissão, são os principais desafios. Rosely acredita que a tendência é que as mulheres ocupem cada vez mais espaço na área de segurança, seja em âmbito municipal, estadual ou federal.
“Temos feito nossos trabalhos com muito mais eficiência do
que muitos já fizeram e, assim, vamos continuar cada vez mais avançando,
ocupando nosso lugar e mostrando que somos tão boas ou até melhores que os
homens em muitas áreas da segurança pública”, reconhece Rosely.
Durante as rondas pelos bairros de Sumaré, a patrulheira
observa que a presença feminina é um conforto para mulheres em situação de
vulnerabilidade. “Somos vistas como um porto seguro, que elas podem contar,
conversar e se abrir, coisa que seria difícil só com uma guarnição masculina”,
destaca.
PATRULHA MARIA DA PENHA
Em Monte Mor, a participação feminina no quadro de
patrulheiros da Guarda Municipal é de 4,9% do total do efetivo, formado por 77
patrulheiros, segundo informações da Assessoria de Imprensa. Além do serviço
regular de patrulhamento, as mulheres atuam na Patrulha Maria da Penha, serviço
de atendimento a vítimas de violência doméstica.
O secretário de Segurança Pública de Elias Fausto, Marcelo
Henrique da Silva, informou, por meio da Assessoria de Imprensa, que dos 43
agentes da Guarda Municipal, sete são mulheres, o que representa 16,3% do
total.
“As mulheres atuam nas mesmas funções que os homens,
incluindo patrulhamento, rondas ostensivas, fiscalização, atendimento ao
público e funções administrativas. Algumas atuam, também, em patrulhas
especializadas, como a Patrulha Maria da Penha e patrulha rural”, disse o
secretário.
PRESENÇA FEMININA NAS FORÇAS POLICIAIS AINDA É BAIXA EM TODO
BRASIL, APONTA ESTUDO
O estudo Raio-X das Forças de Segurança Pública no Brasil,
divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança, no ano passado, aponta que as
mulheres representam somente 16,1% do efetivo das guardas municipais em todo o
Brasil.
A pesquisa mostra ainda que a presença feminina é maior na
Polícia Civil. Em 2023, as mulheres eram 24.764 do efetivo desempenhando
tarefas de investigação, registros, apurações e diligências — o que equivale a
27% dos servidores. Já o efetivo masculino de policiais militares nesse mesmo
ano é de 66.870.
O número de mulheres na Polícia Militar é muito inferior ao
de homens. Os dados do Raio-X das Forças de Segurança Pública no Brasil mostram
que existem 51.779 mulheres na corporação, o que representa 12,8%. Os homens
são 353.092. Nos efetivos dos Bombeiros, elas representam 14% do total.
“O desafio é que as forças de segurança se adequem às demandas do século 21”, diz Samira Bueno, diretora executiva do Fórum Brasileiro de Segurança. Segundo Samira, o baixo número de mulheres nas forças policiais impacta diretamente nas demandas priorizadas.
ENFRENTAMENTO AO MACHISMO DENTRO E FORA DA CORPORAÇÃO
Ana Paula de Andrade Moreno é uma das quatro presenças
femininas na Guarda Civil de Monte Mor. Ela conta que decidiu pela profissão ao
observar a rotina de trabalho de amigos policiais e perceber que se
identificava. Há pouco mais de cinco anos, Ana Paula deixou o departamento
financeiro de um comércio para atuar na segurança pública.
“É uma área que exige disciplina, coragem, não tem rotinas e
a cada dia trabalhado é um novo desafio...Nosso papel é solucionar conflitos
com justiça, garantindo a segurança da população”, comenta Ana Paula.
Dentre os desafios da profissão, a guarda municipal aponta o
preconceito de gênero como principal. “Infelizmente ainda prevalece o machismo
dentro das corporações. Existe uma desproporcionalidade, pois são
aproximadamente 80 homens e apenas quatro mulheres. Então, a nossa luta é
diária”, observa.
Ana Paula: temos que provar o tempo todo que possuímos a mesma capacidade que os homens
Realidade que ela diz enfrentar desde o curso de formação
para Guarda Civil, onde Ana Paula era a única mulher na turma de 17 alunos. “Eu
ouvia de alguns instrutores que caso eu não conseguisse realizar alguma
atividade proposta (por ser mulher), poderia fazer com menos quantidade ou com
menos intensidade. Mas, sempre fiz igual aos homens porque acredito que minha
capacidade é independente do gênero”, assinala.
O enfrentamento ao preconceito se mantém no dia a dia de Ana
Paula. “Quando estamos na condução de direção veicular das viaturas, ouvimos
piadas de que mulher no volante é perigo constante, mas, não me importo com
nada disso... Sempre sigo firme em todas as funções, sem distinção por conta de
gênero”, conta.
“Já ouvi de Guarda Municipal da própria corporação que não
trabalharia comigo por insegurança, porque sou frágil. Então, nós temos que
provar o tempo todo que possuímos a mesma capacidade de trabalho que os homens.
Reconheço que a força física masculina é incomparável em relação a da mulher,
mas isso não me torna menos capaz”, pondera.
Para Ana Paula, a presença feminina nas forças policiais é
imprescindível. “Percebe-se através de relatos das vítimas que, muitas vezes,
elas deixam de registrar ocorrência por receio de julgamentos machistas. Assim,
quando se deparam com uma mulher, sentem-se acolhidas e apoiadas para
prosseguirem nas denúncias”.
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