Maria Renovato, a artesã que transforma fibra de bananeira em objetos de decoração
Por meio da arte popular, agricultura do Assentamento 3, em
Sumaré, reaproveita a matéria-prima vegetal, que costuma ser jogada fora, e
gera renda com a confecção de cachepôs, cestas, porta-joias e garrafas
Da terra brota a bananeira, que dá frutos, alimenta. Das
mãos da artesã e agricultora Maria Renovato, 58 anos, as fibras retiradas do
tronco da árvore frutífera mais popular do Brasil viram objetos de decoração e
utensílios domésticos. Moradora do Assentamento Rural Sumaré 3, Maria divide o
tempo entre a lida na roça e a produção de peças de artesanato ecologicamente
corretas, uma arte que faz parte da sua vida há mais de 15 anos.
A matéria-prima para produzir cachepôs, cestas de vários
tipos, tamanhos e formatos, decoração de caixas de madeira em MDF, porta-joias,
garrafas, descanso para panelas, apoio de prato, dentre outros, sai do pomar do
sítio de Maria e das terras de agricultores da vizinhança.
“Um tronco rende muita fibra. Normalmente, o tronco da
bananeira é descartado, após a colheita do cacho de bananas. Com a produção de
artesanato reaproveito o tronco e ainda garanto uma renda extra”, conta Maria.
É que o pé de bananas dá frutos uma única vez e depois tem seu caule cortado para brotar novamente. A fibra de bananeira é extraída do pseudocaule (tronco) da bananeira, que é cortado após a colheita da fruta. Durante a pandemia, a artesã teve que suspender a produção de peças. Com o isolamento social, a rotina de comercializar os objetos em feiras de artesanato de Sumaré e da capital paulista foi paralisada. Agora, a artesã retoma o trabalho que, segundo ela, virou uma paixão.
“Teve uma época que o artesanato com fibra de bananeira era
minha única fonte de renda. Senti a parada na época da pandemia. Agora, estou
voltando a produzir. Não vejo a hora de estar nas feiras novamente. Gosto do
artesanato. É bom. Também gosto de ensinar. Já dei curso como voluntária nos
CRAS (Centro de Referência em Assistência Social) aqui em Sumaré”, orgulha-se.
Antes da fibra de bananeira, as sementes já foram
matéria-prima da arte de Maria, sua primeira experiência com o artesanato. Na
época, a artesã transformava sementes de diversas espécies como de jatobá,
leucena, mamona, pau-brasil, colhidas no próprio assentamento, em biojoias
(brincos, colares e pulseiras) e decoração de caixas de MDF.
A habilidade para produzir objetos com fibra de bananeira
foi conquistada com persistência. O primeiro contato de Maria com a técnica foi
num curso ministrado para um grupo de 20 mulheres dos assentamentos, em 2005.
“Tive dificuldade de aprender o trançado por ser canhota.
Era a pior aluna numa turma de 20 aprendizes. Acho que a professora ficou
desanimada comigo”, relembra.
Autodidata, após terminar o curso, Maria continuou tentando
colocar as técnicas de trançado em prática. O aprendizado veio. “Quando vi
minha primeira peça pronta, uma caixa decorativa em MDF, me apaixonei e não
parei mais”, diverte-se.
O talento da artesã ganhou fama e os convites para expor e
comercializar seus produtos em feiras da capital paulista começaram a chegar.
Uma das mais desafiadoras, conta, foi a participação numa feira no Anhembi
porque tinha que produzir peças para quatro dias de exposição. Ela deu conta.
“Nesta feira encontrei a professora que deu o curso no
assentamento. Ela ficou surpresa com os objetos expostos no estande. Tinha até
bolsa de praia feita de fibra de bananeira. Foi uma satisfação para mim que não
tinha sido uma boa aluna”, destaca Maria.
O passo a passo para transformar a fibra de bananeira em
arte é longo. Após extrair a matéria-prima, ela é colocada para secar num varal
de arame, processo que dura de dois a três dias, se tiver sol. Depois, Maria
trata o material com produtos antifungo e coloca novamente para secar. A etapa
seguinte é começar a trançar as tiras de fibra, que ganham forma com um ponto
rústico e charmoso. Com os objetos prontos, Maria passa um verniz transparente
para manter as características naturais da fibra, cuja cor varia conforme a
exposição ao sol. É preciso mais um dia para secar e as peças estão prontas
para serem comercializadas.
A artesã consegue produzir uma média de duas peças por dia.
O trabalho é grande, o lucro nem tanto. “Antes da pandemia, a renda com a venda
em feiras de Sumaré era de cerca de R$ 500 mensais. Quando ia para feiras fora
da cidade, em São Paulo, chegava a R$ 1 mil. Dia das mães vendemos bem. As
pessoas compram muitos cachepôs”, contabiliza.
Maria também produz por encomenda. Um dos maiores pedidos
foi de 170 caixinhas para colocar pão de mel e trufas, que seriam utilizadas
como brindes num evento religioso para mulheres. “Tem gente que pede para
lembrancinha de casamento, brindes de Páscoa”.
As mãos habilidosas e sustentáveis da artesã-agricultora é a
única “ferramenta” para trançar as palhas de bananeira e transformá-las em
lindos objetos de decoração, o que exige mais tempo para a confecção das peças.
O sonho de Maria? “Ter um tear para facilitar o trabalho artesanal”, responde.
Família criada no assentamento que é modelo no Brasil
Maria chegou no assentamento rural em 1992, onde criou as
três filhas. “Elas estudaram na escola rural”, recorda. No ano 2000, participou
de uma seleção para o assentamento 3, onde vive até hoje com o marido. No sítio
do casal, também moram as três filhas casadas e sete netos.
Além de produzir artesanato, Maria trabalha na roça. Ajuda a
manter limpo, sem mato, o pomar que abriga pés de bananas e de manga. O
principal produto agrícola da família é a produção de mandioca. A família de
Maria é uma das cerca de 70 famílias que vivem nos assentamentos rurais de
Sumaré, modelos na região, no Estado e em todo o Brasil pela organização e
produção agrícola familiar, uma trajetória de 38 anos, que começou em 1984, com
a ocupação da primeira área rural, o assentamento 1.
De acordo com dados do portal da Prefeitura de Sumaré, os
assentamentos rurais são divididos em três núcleos (Assentamentos I, II e III),
onde vivem cerca de 70 famílias titulares de terras e agregados, totalizando aproximadamente
850 pessoas entre crianças, jovens, adultos e idosos.
Todos os assentados, informa o site, sobrevivem direta ou
indiretamente das atividades agropecuárias. Nos assentamentos são produzidos
frutas, verduras e legumes. Os assentamentos rurais recebem turistas e
estudantes interessados em conhecer o modo de produzir, viver e se organizar
nas áreas rurais.
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